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Alvitrando

Aqui se dão alvíssaras e trocam ideias sobre temas gerais, o Alentejo e o poder local, e vou dando notícias das minhas reflexões sobre temas da actualidade e de acontecimentos que achar que devem ser divulgados por esta via.

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Aqui se dão alvíssaras e trocam ideias sobre temas gerais, o Alentejo e o poder local, e vou dando notícias das minhas reflexões sobre temas da actualidade e de acontecimentos que achar que devem ser divulgados por esta via.

Que Saúde (não) temos – uma estória da vida real e algumas reflexões

Zé LG, 12.10.22

Banner-Lopes-Guerreiro-300x286.jpgO Zé, no início do Verão, queixou-se ao médico de família de uma dor que apenas se fazia sentir no tornozelo da perna direita quando caminhava um pouco mais ou mais depressa. O médico de família mandou fazer um RX e uma TAC à coluna, o que o Zé fez numa clínica privada, porque tem ADSE e grande parte dos custos são suportados por aquele subsistema de Saúde. Obtidos os resultados dos exames, o Zé foi entregá-los no Centro de Saúde, para que o médico de família o contactasse para lhe dizer o que devia fazer. Passados uns dias, o médico de família, face ao que viu nos exames e perante a perda de força no pé, recomendou ao Zé que fosse a um especialista. O Zé recorreu, mais uma vez, a um especialista particular, o que só aconteceu em meados de Setembro, quando o pé já tinha ficado completamente pendente. O especialista disse que tinha o nervo ciático preso e que deveria fazer um intervenção cirúrgica o mais rapidamente possível, para libertar o nervo e tentar recuperá-lo.

O Zé assim fez, marcou uma consulta numa clínica privada especializada no tratamento da coluna, com intervenção intervenção pouco invasiva. No início de Outubro, deu entrada na clínica, onde fez diversas consultas. Foi levado a um cardiologista e deslocou-se a um hospital, ali ao lado, para fazer uma ressonância magnética, que permitiu o diagnóstico final da causa do problema: um bico de papagaio. No dia seguinte foi operado de manhã e de tarde recebeu indicações sobre como devida fazer a recuperação e no terceiro dia teve alta. Por esta intervenção o Zé teve de pagar sete mil e quinhentos euros, porque a clínica não tem convenções com seguradoras ou subsistemas de Saúde.

Esta é a estória de um Zé que tem condições financeiras para suportar os custos com consultas, exames, internamentos e cirurgias em clínicas privadas, para além de deslocações e outras despesas associadas. Mesmo que ressarcido de algumas das despesas pelo subsistema de Saúde de que é sócio, teve de fazer adiantamentos e suportar custos que não são pagos.

E, se em vez deste Zé, fosse outro Zé, um dos que faz parte da quase metade dos portugueses que apenas têm acesso ao Serviço Nacional de Saúde? O que lhe teria acontecido? Já teria feito os exames? Já teria tido a consulta com um especialista? Já teria feito a cirurgia? – Pelo conhecimento que todos temos, certamente que, pelo menos, a consulta com o especialista e a cirurgia ainda não teriam sido feitas, tendo em conta os prazos registados.

O Serviço Nacional de Saúde foi convocado e, quase, totalmente mobilizado, durante dois anos, para dar resposta à pandemia da COVID-19. Muitos foram os alertas lançados para os perigos que tal estratégia iria provocar, com consultas, exames de diagnóstico, cirurgias e tratamentos de, praticamente, todas as outras doenças adiados para além do limite dos limites. O governo foi sempre tentando “tapar o Sol com a peneira”, como se os portugueses andassem distraídos e não se apercebessem do que realmente se estava a passar, anunciando e repetindo vezes sem conta os investimentos e as contratações de médicos, enfermeiros e outros técnicos e pessoal de apoio que estava a fazer.

Controlada, pelo menos até ver, a pandemia, eis-nos perante o verdadeiro estado em que se encontra o Serviço Nacional de Saúde, sem capacidade para assegurar serviços de Saúde, nalguns casos nem os mais urgentes, a todos os portugueses que deles necessitem. E confirmou-se, como era evidente que iria acontecer: o aumento de mortes; o diagnóstico de doenças graves com atrasos que, em muitos casos já não permitem o tratamento ou recuperação; o caos nalgumas urgências; a inoperacionalidade de serviços e atrasos inaceitáveis na prestação de diversos serviços.

Os problemas do Serviço Nacional de Saúde não nasceram com a COVID-19. Já existiam antes e a mobilização de, quase, toda a sua capacidade para o combate à pandemia veio dar-lhe um duro golpe, que, esperemos não seja o final. Sabe-se agora que mais de cinquenta por cento dos portugueses já têm seguros ou outro qualquer subsistema de Saúde. É, senão a mais alta, uma das mais altas taxas dos países europeus!… O que revela bem a perda de confiança dos portugueses no Serviço Nacional de Saúde.

O governo anunciou que, com os últimos diplomas legais aprovados e com, base neles, separadas as responsabilidades políticas, que continuam na alçada do ministro da pasta, das responsabilidades técnicas e organizativas, agora a atribuídas a um Director Executivo (CEO, em inglês), foram criadas as condições para reorganizar e recuperar o Serviço Nacional de Saúde, de forma a cumprir a sua verdadeira missão, que é a de assegurar a todas as pessoas, independentemente das suas condições e circunstâncias, todos os serviços de Saúde de que necessitem, em tempo útil e boas condições e de forma tendencialmente gratuita.

A escolha do ministro da Saúde, por algumas das posições que tem defendido, e a sua entrada em funções, com questões de incompatibilidades legais e éticas, não auguram o melhor. Esperemos que tenham sido apenas alguns tropeções neste início de caminhada, de quem estava muito cómodo no Parlamento Europeu… e que seja capaz de proporcionar as condições necessárias à afirmação do Serviço Nacional de Saúde como serviço público, para todos e tendencialmente gratuito.

Fiquem bem! Até para a semana!

Oiçam aqui.

 

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