“O que falta nesta ideologia dominante não habita as consciências”
“Na vida pública, é habitual não se dar conta do que produzem os mais variados serviços indispensáveis para o normal funcionamento da sociedade. Por falta de visibilidade material e perene, não se considera que fazem parte da vida económica, do desenvolvimento. O que é valorizado como significativo são as infraestruturas bem visíveis, como auto-estradas, aeroportos, edifícios fabris, etc. Apenas o que modifique a percepção do horizonte à volta. O trabalho diário e invisível de professores, profissionais de saúde, administrativos e funcionários, etc. não modifica a ideia de que nada fazem mexer. Nos dias de hoje, a certeza de desenvolvimento que se constrói nas mentes baseia-se no número de viaturas pessoais, na intensidade do tráfego rodoviário, na confusão urbana. O que falta nesta ideologia dominante não habita as consciências. É pois difícil exercer o contraditório, fazer ouvir alguma crítica. Onde o sentido do progresso civilizacional é medido pelas toneladas de combustíveis consumidas é árduo ter uma narrativa contra-corrente. Globalmente, a consciência da Humanidade parece andar desprovida de realidade, especialmente da sua parte intangível. E localmente? Aqui, em Beja, também. Também se diz que não há nada, que falta tudo. É certo que boa parte dos insaciáveis procuram outras distantes paragens, outras satisfações. E se perguntássemos aos que vão ficando, às famílias que aqui crescem? Se lhes perguntássemos o que conseguiram erigir, e como? Se soubéssemos olhar para outros indicadores que não os estatísticos? Se valorizássemos os casos exemplares? Se déssemos outro significado ao conceito de sucesso?”
Munhoz Frade 20.09.2020, aqui.