Aeroporto de Beja: juntem-se, porra!
A trapalhada dos “despachos” sobre os “novos” aeroportos recolocou Beja no processo de decisão sobre a rede aeroportuária nacional. Cabe aos atores alentejanos, muito especialmente às autarquias (através das Comunidades Intermunicipais - do Alto Alentejo, do Baixo Alentejo, do Alentejo Central e do Alentejo Litoral), aos deputados eleitos pelos círculos eleitorais de Beja, Évora, Portalegre e Setúbal, aos representantes da economia, à CCDRA, à ERT e aos demais agentes e organizações da sociedade civil alentejana, a responsabilidade de desencadearem uma ação concertada que cumpra o objetivo de a região se fazer ouvir quanto à pertinência que tem a utilização do aeroporto de Beja para, com custos comportáveis e num prazo aceitável, contribuir para a mitigação dos constrangimentos do aeroporto Humberto Delgado.
Cabe também ao edil da capital do país um papel relevante neste processo, assim saiba ele aproveitar a magnânima oportunidade de se afirmar e de posicionar Lisboa em posição cimeira na corrida pela descarbonização e pelo combate à poluição sonora num grande centro urbano como advém de existir um aeroporto dentro da malha citadina, sem menosprezar o risco de um grave acidente no seu coração (longe vá o agoiro).
Naturalmente que não nos vamos pronunciar sobre questões técnicas que, e muito bem, têm sido tratadas com elevada competência pelos especialistas nacionais com reconhecida experiência nesta matéria. A nossa intervenção inscreve-se mais dentro do espírito de cidadania ativa que a todos compete, lançando algumas questões que, não constituindo novidade, se afiguram incontornáveis:
- É ou não pertinente considerar que a Portela jamais poderá corresponder às necessidades da capital e do país, sendo de perspetivar a sua substituição por um novo e moderno aeroporto internacional, concebido para um largo horizonte temporal, suficientemente longe e suficientemente perto da capital, dentro da Área Metropolitana de Lisboa, mas fora de zonas de elevada densidade populacional, com os menores danos possíveis em termos ambientais? Sem margem para dúvida: é! Dentro dos requisitos menos gravosos qual a melhor localização? Dizem-nos os técnicos que no Campo de Tiro de Alcochete. É caro? É! O país suporta? Tudo indica que sim. Isto se, por um lado, a concessionária entrar com a “parte de leão” como lhe compete, e por outro não nos pusermos em bicos de pés a querer fazer o que já está feito, armados em estroinas. Em princípio, com decisões agora, Alcochete atingirá maturidade plena dentro de duas décadas a um quarto de século.
- Então, por que razão o aeroporto de Beja é chamado à discussão uma vez que Alcochete é a solução? Simplesmente porque Beja existe, é verdade: existe mesmo, com duas pistas de aterragem cuja extensão faz inveja a qualquer infraestrutura similar nas maiores cidades do mundo, com acessibilidades facilitadas, segurança máxima e impactos ambientais reduzidos comparativamente a outras soluções, para além das excecionais condições climatéricas, de luminosidade e orográficas que foram determinantes para a escolha do local enquanto base militar. Um aeroporto que no curto prazo poderá ser adaptado para uma nova função de complementaridade do principal aeroporto nacional e do aeroporto de Faro, função que, embora diminua de importância no médio prazo, sempre poderá continuar a assegurar, sem custos adicionais para o erário público que não os derivados do redimensionamento da estrutura de acolhimento de passageiros e de aeronaves, bem como na infraestrutura ferroviária e rodoviária, cujos investimentos (peanuts, como agora soe dizer-se) - na ordem dos 20M€/ano no próximo triénio em OE, considerando o apoio não reembolsável dos FEEI - só por si, estão muito longe dos custos da solução alternativa, o aeroporto complementar mais em voga, o do Montijo, cuja entrada em operação, ao invés do aeroporto de Beja, muito dificilmente dará em tempo oportuno um contributo para aliviar a pressão na Portela.
Acrescendo o reforço das valências atuais do aeroporto de Beja, quanto à utilização civil, com impactos consideráveis no turismo, na agroindústria e na manutenção aeronáutica, polarizador de atividades fundamentais à coesão territorial em territórios de baixa densidade.
- Será que o “defunto despacho” adotando a solução Portela+ Montijo+ Alcochete, aparentemente para agradar a gregos e troianos do mundo da especulação imobiliária, estava ou não armadilhado? Cremos que sim. Quando se condiciona Alcochete a uma perspectiva de saturação da Portela+ Montijo, estamos em crer que Alcochete não passaria de uma miragem, quando todos sabemos que uma parte das medidas para a descarbonização passa pela diminuição do tráfego aéreo em benefício do tráfego ferroviário, apontando-se já para que a generalidade das ligações entre as capitais europeias flua entre carris.
- Afinal por que é que Beja não pode fazer parte da equação aeroportuária do momento? Simplesmente porque estará a cerca de uma hora e vinte e cinco minutos de Entrecampos em Lisboa e de Albufeira, independentemente do recurso à rodovia ou à ferrovia modernizada. Sem esta modernização, tal como estamos agora, serão mais vinte minutos. Esta circunstância tem sido suficientemente debatida, tecnicamente comparada com o tempo de deslocação entre muitos dos aeroportos europeus e as cidades que servem, concluindo-se que essa é a situação mais comum. Não obstante, dizem que Beja está a milhas, muitas milhas da capital! Enfim, as milhas entre Beja e Lisboa são bem mais compridas que as milhas de entre Paris e o aeroporto Beauvais-Tillé (1h 15 mn), Barcelona e o aeroporto de Girona (1h 15mn) e Frankfurt e o aeroporto Hahn (2h 10mn), ou ainda, conforme testemunhos muito atuais, entre o centro de Londres e Stansted (2h 30mn).
Dispensamo-nos de comentários sobre o impacto na coesão territorial e desenvolvimento regional que a valorização do aeroporto de Beja traz, juntando a nossa voz aos que têm vindo a sublinhar a questão.
Voltando à oportunidade, premência e pertinência da sugerida ação concertada: na nossa ótica, faria sentido um esforço circunstancial de convergência, descomplexada, entre os atores apontados, que deveriam solicitar uma audiência formal ao Presidente da República e ao Primeiro Ministro, previamente trabalhada nos bastidores através dos que na região lhes são mais próximos, com convocatória à comunicação social. Deputados alentejanos e edis como o de Beja, o de Évora e o de Lisboa são pedras importantes neste tabuleiro. Basta entregar em mão uma folha A4 redigida com o necessário consenso em defesa de Beja e do interesse nacional, sem perda de identidade de cada subscritor. Juntem-se, porra!
Fernando Caeiros - Presidente da Câmara Municipal de Castro Verde (1976-2008) e Vogal Executivo na Autoridade de Gestão do Programa Operacional Regional do Alentejo (2008-2012).
José Lopes Guerreiro - que, de entre outros cargos, foi: vereador na Câmara Municipal de Beja, Presidente da Câmara Municipal de Alvito, Presidente da Associação de Municípios do Distrito de Beja e Presidente da Região de Turismo Planície Dourada.
In: https://www.publico.pt/2022/07/29/opiniao/opiniao/aeroporto-beja-juntemse-porra-2014225