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Alvitrando

Aqui se dão alvíssaras e trocam ideias sobre temas gerais, o Alentejo e o poder local, e vou dando notícias das minhas reflexões sobre temas da actualidade e de acontecimentos que achar que devem ser divulgados por esta via.

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Aqui se dão alvíssaras e trocam ideias sobre temas gerais, o Alentejo e o poder local, e vou dando notícias das minhas reflexões sobre temas da actualidade e de acontecimentos que achar que devem ser divulgados por esta via.

A revolta dos homens da terra

Zé LG, 14.02.24

Banner-Lopes-Guerreiro-300x286.jpgNo primeiro dia deste mês, os homens da terra suspenderam as suas actividades nos campos, montaram-se nos tratores e, com máquinas e alfaias agrícolas, cortaram estradas e fronteiras por todo o país, mostrando os seus descontentamentos e protestando contra o que está a dificultar as suas actividades e reclamando tudo o que consideram necessário para continuarem a produzir o que comemos.
A gota de água que fez transbordar o copo cheio de descontentamentos foi o anúncio de cortes nos apoios contratualizados das medidas agro-ambientais. Mas o descontentamento era de tal dimensão que, perante a passividade das suas organizações representativas, os homens da terra reagiram em massa ao apelo feito, através das redes sociais, por um auto-denominado Movimento Cívico de Agricultores de Portugal, e manifestaram-se por todo o país.

Nem mesmo o anúncio do governo de apoios de valor de meio milhão de euros, feito através dos ministros da Agricultura e das Finanças, nem a posição da CAP de que estava a negociar com o governo os impediu de virem para a rua, afirmar que a agricultura não pode continuar a ser desvalorizada e que têm de ter condições para continuarem a produzir.
Desta revolta dos agriculores, importa reter alguns ensinamentos que, se não forem devidamente tidos em conta, poderão criar sérios problemas, não só neste sector de actividade mas noutros também.
A PAC – Política Agrícola Comum e a Política Agrícola nacional, ou a ausência dela, estão de tal forma desconformes com as necessidades desta fundamental actividade que geraram esta revolta e grandes manifestações, não só em Portugal como noutros países, onde já antes tinham começado. O que prova que, quer a Comissão Europeia quer o governo português, desvalorizaram a agricultura, depois de tanto terem valorizado o papel dos homens da terra que, mesmo durante a pandemia, nunca deixaram de trabalhar para nos assegurar o que comemos. Foi Sol de pouca dura...
As pessoas estão a usar, cada vez mais, os novos meios que têm ao seu alcance, neste caso as redes sociais, para se mobilizarem para as acções e lutas que consideram dever desenvolver, quando as suas organizações políticas, sindicais, profissionais, associativas ou outras não o fazem. Estes movimentos inorgânicos, seja o Movimento Cívico de Agricultores sejam outros como os dos professores ou das polícias, levantam desafios de diversa ordem com os quais o Estado e as organizações parecem terem dificuldades de lidar.
A agricultura, para além do seu papel fundamental de nos assegurar a nossa alimentação, é a actividade que mais presente está em todo o território, que, melhor ou pior, pode contribuir mais para a preservação do ambiente, para a fixação das pessoas nos territórios de baixa densidade demográfica e a prevenção e o combate aos fogos. Por tudo isso deve ser valorizada e reconhecida a importância dos seus agentes e asseguradas as condições necessárias para que a possam prosseguir e não tenham de a abandonar. Sempre e não apenas em tempos de crise.
Quando falamos em agricultura, estamos a falar em actividades muito diferenciadas em função das regiões, das dimensões e outras características das explorações e das empresas por elas responsáveis, dos tipos e modos de produção, da sua complementaridade com outras actividades, enfim de uma diversidade grande que exige políticas e medidas diversificadas e adequadas, como esta revolta evidenciou ao exigir que a ministra da Agricultura, para além de respostas gerais, tivesse sido obrigada a tratar de questões específicas.
A diversidade e a complexidade desta actividade vieram também evidenciar como os que estão sempre a reclamar menos Estado são os mesmos que, nos momentos de aflição, mais reclamam a intervenção do Estado para a resolução dos seus problemas. E, assim, não foi de admirar que, para além da reivindicação do cumprimento dos apoios contratualizados, tenham reclamado a intervenção do Estado quer nos preços dos factores de produção quer nos dos produtos que produzem e nas margens de comercialização dos grandes grupos da distribuição.
A Comissão Europeia e os governos, designadamente o de Portugal, mesmo em gestão, assustaram-se com os impactos da revolta dos agricultores e de outros que com eles se relacionam, e, por isso mesmo, avançaram de imediato com algumas, poucas, medidas de apoio concretos, e, muitas, promessas, como a da adequação das regras impostas à produção, comparativamente com as de outros continentes, e outras de maior fôlego e mais estruturantes.
Tempos difíceis e complexos, como os que estamos a viver, com uma crise climática sem controlo à vista, pandemias, guerras e outros acontecimentos e fenómenos naturais que põem em causa a necessária alimentação da humanidade, em muitos pontos do planeta, exigem uma atenção redobrada dos poderes políticos para garantir as condições necessárias ao desenvolvimento desta primeira e fundamental actividade humana. E não apenas na perspectiva da rentabilidade económica, mas também da sustentabilidade territorial e ambiental e da coesão regional, demográfica, económica e social do nosso País, da União Europeia e de todo o mundo.
Exige-se mais visão estratégia, cooperação e não deixar para amanhã o que se deve e pode fazer hoje.
Até para a semana!

LG, 13/02/2024

Pode ouvir aqui.

 

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