O Presidente da República, Cavaco Silva, no seu habitual discurso de Ano Novo, afirmou, entre outras coisas, que “somos todos responsáveis” pela situação que o país atravessa e que “temos de trabalhar mais” para produzir mais e melhorar a nossa economia.
Vale a pena debruçarmo-nos um pouco sobre estas afirmações.
Se é verdade que “somos todos responsáveis” pela crise que estamos a viver não é menos verdade que o grau de responsabilidade é bastante diferente entre aqueles que, cumprindo todos os seus deveres, têm como única responsabilidade a de ter votado nos que têm governado o país e que o trouxeram a esta grave situação, e os que tenho sido escolhidos para governar Portugal e se comprometeram a resolver os seus problemas e a colocá-lo no caminho do progresso não cumpriram o que prometeram. Não é a mesma coisa! Afirmar, como fez Cavaco Silva, que “somos todos responsáveis” é pretender “meter todos no mesmo saco” e desresponsabilizar os que têm mais responsabilidade, a começar por ele próprio, que foi ministro das Finanças, primeiro-ministro (10 anos, 8 dos quais com maioria absoluta) e agora Presidente da República.
Se também é verdade que “temos de trabalhar mais” para produzir mais e melhorar a nossa economia não é menos verdade que cada vez mais portugueses têm oportunidade de contribuir para esse objectivo pela simples razão de que são atirados para o desemprego, não conseguindo, muitos deles, voltar a trabalhar.
A um Presidente da República exige-se palavras de esperança e confiança na capacidade dos portugueses, a começar pelos governantes, de superarem a as dificuldades, mas também se exige rigor e seriedade no que afirma. Neste momento, mais do que uma “conversa em família”, como outras de triste memória, exigia-se um discurso de verdade, de assunção de responsabilidades e de exigência ao governo que fosse capaz de ultrapassar a crise sem agravar as desigualdades, fazendo uma mais justa distribuição da riqueza. Mas isto seria pedir demais a quem, depois do que disse sobre o corte do subsídio de férias e do 13º mês aos funcionários públicos, promulgou a Lei do Orçamento de Estado com essas medidas, sem o submeter à apreciação do Tribunal Constitucional…