Há vinte anos proferi, enquanto presidente da AMDB, uma declaração no acto de assinatura do contrato para a elaboração do PIDDBE – Plano Integrado de Desenvolvimento do Distrito de Beja, a que dei o título “Rompamos de vez com as falsas fatalidades de que temos sido vítimas!”.
Nessa declaração, apontei um conjunto de carências e problemas que afectavam o Distrito de Beja e que, tal como o título sugeria, não se tratavam de fatalidades.
O facto da região ser a mais atrasada, com cada vez menos gente, duplamente envelhecida, com pouca formação profissional e um nível de desemprego superior ao do resto do país e simultaneamente ter grandes recursos naturais, culturais e ambientais não se tratava de uma fatalidade.
Tal como não era por fatalidade que a região se tinha limitado a ser um corredor de passagem, a agricultura se encontrava atrasada, não era implementado o Plano de Rega do Alentejo nem eram aproveitados os múltiplos fins de Alqueva, o aeroporto de Beja não era utilizado simultaneamente para usos civis, as estradas que permitissem ligações fáceis Beja – Mértola – Vila Real de St.º António, Sines – Beja – Ficalho – Sevilha e Beja – Odemira – Costa Alentejana tardavam em ser arranjadas, a via-férrea que liga Beja ao Algarve não era melhorada e o ramal de Moura tinha sido encerrado, não era acrescentado mais valor às matérias-primas regionais, a riqueza aqui gerada não era aqui reinvestida, na distribuição dos fundos comunitários a nossa região foi a menos beneficiada, o PDR previu o agravamento da situação de subdesenvolvimento em que nos encontrávamos, a Regionalização continuava congelada, sendo exercidos os poderes que deverão caber às Regiões por órgãos desconcentrados do Poder Central sem ter em conta as aspirações das populações.
No passado dia 7 de Fevereiro, publiquei no meu blogue, Alvitrando, aquela minha intervenção, expurgada de alguns, poucos, pontos que, entretanto, ficaram desactualizados ou com menos interesse, com o objectivo de salientar como o tempo parece não passar nesta região, tal é o tempo que os problemas que a afectam levam a ser resolvidos.
Duas décadas passadas, com três Presidentes da República, oito governos do PS, PSD e PP e diversas maiorias na região, quer no Parlamento quer dos municípios, quase sempre do PS, e o que mudou desde então? É claro que algo mudou, mais que não fosse por força da inércia – o empreendimento de Alqueva e o Aeroporto de Beja estão quase prontos, embora, duas décadas (!!!) depois, ainda não estejam prontos e a funcionar – e outros projectos foram executados e existe outro dinamismo nalguns sectores. Mas no essencial, no que eram então os traços que caracterizavam esta região, o que mudou?
Tal como há vinte anos, parece evidente que não é por fatalidade que isto acontece, mas por (falta de) vontade política de quem detém o poder. E se é certo que os governos não têm mostrado serem amigos desta região também não deixa de ser verdade que os poderes regionais e locais não têm conseguido pôr de parte divergências naturais e unirem-se em torno do essencial. Como escrevi então: Para isso é preciso tocar a reunir e reunir todas as vontades, sem excepção, e definir um modelo de desenvolvimento integrado, com propostas e projectos concretos e prontos, definindo o papel que cabe a cada interveniente no processo e o maior denominador comum para o desenvolvimento da nossa região, pelo qual nos saibamos bater e lutar.
A vontade dos homens e as vontades dos poderes constituídos também se mudam. É isso que tem de acontecer e rapidamente para que o desenvolvimento e o progresso da nossa região e o bem-estar das nossas gentes se concretizem, sob pena de perdermos irremediavelmente esse comboio.
Alguns comentários feitos à publicação daquela minha declaração no Alvitrando, com a imediata e voluntarista disponibilização de algumas pessoas para participarem na elaboração de um do proposto “Caderno Cívico para a Revitalização do Alentejo”, revela existir uma outra postura de muita gente, que já não se acomoda perante as falsas fatalidades que nos atingem.
Alvito, 22 de Fevereiro de 2010
Publicado na revista Mais Alentejo nº 98.