Jaime Silva, o ministro da Agricultura, quando fala, pronunciando-se seja o que quer que seja, arranja sempre polémica.
É o que mais uma vez aconteceu agora.
Afirmou que a CNA e a CAP têm, entre os seus dirigentes, pessoas de extrema-esquerda e extrema-direita, ligadas a partidos políticos, como se isso fosse proibido, justificando, dessa forma, a convocação de manifestações por ambas as confederações de agricultores, a reivindicar apoios do governo para fazer face às dificuldades extraordinárias que o sector está a atravessar.
Pouco antes afirmara que, embora o seu ministério estivesse a analisar as propostas apresentadas pelas confederações de agricultores os problemas destes não se resolvem com subsídios mas com mais produção.
Não é tanto o que em concreto afirma mas o significado das suas afirmações e a forma como as produz que, julgo, merece ser apreciado.
A forma como Jaime Silva se refere aos agricultores e aos funcionários do seu ministério, que ele também é, segundo julgo saber, é a do confronto como se eles fossem os seus inimigos a abater, os malandros que só querem subsídios e os malandros que nada fazem e se aproveitam das suas funções para tratarem dos ses interesses pessoais.
É o estilo do chefe do governo, José Sócrates, o “animal feroz”, como se intitulou a si próprio, e que segue à risca o lema do “sempre presente” Jorge Coelho de que “quem se mete com o PS come”.
Mas é também a interpretação populista de que quem ataca os malandros dos agricultores, dando a ideia que são todos grandes e que só vivem de subsídios, e dos funcionários públicos, dando a ideia que são todos uns aproveitadores das benesses do Estado, é bem visto pelos outros portugueses, que são a maioria.
Mas, e isso é ainda mais grave, representa a visão que os urbanos têm do mundo rural e, em particular, da agricultura.
É a visão de que o mundo rural não tem qualquer interesse, não presta a não ser para passar uns dias num qualquer “monte” próprio ou de amigos nada interesseiros, ou, ainda, num qualquer empreendimento turístico, de preferência PIN, a marca certificada deste governo.
E só para esse fim é que se justifica, na sua opinião, investir em infra-estruturas como electrificação, caminhos, alojamentos ou outros edifícios para armazenamento, guarda de equipamentos ou gado.
É nessa perspectiva que o ministro e o seu ministério acham que não se justificam as electrificações na Serra de Serpa, porque só serviriam alguns que persistem em por ali se manterem ou, pior do que isso, ali instalaram pequenas unidades agro-alimentares de fabrico de queijos ou enchidos.
Era o que faltava! Se ainda fosse para alguma unidade turística, mesmo que só para os próprios e para os amigos, ainda se podia ver o que se poderia fazer…
É nessa perspectiva, ainda, que acham que a energia verde deve acabar e que o gasóleo verde e os outros factores de produção podem subir à vontade porque, para ser competitiva a agricultura tem é de produzir mais.
É evidente que, para eles, é mais importante fornecer o gasóleo mais barato às embarcações de recreio, incluindo os iates particulares, do que aos barcos de pesca ou à agricultura.
É evidente, também, que já se “esqueceram” das orientações contraditórias das várias PAC’s e que ainda não há muito tempo eram pagos subsídios a alguns agricultores para não produzirem ou não produzirem para além de determinadas quotas.
“Tudo isto é triste, tudo isto é fado”, mas é também a nossa subsistência alimentar e enquanto povo que estão a pôr em causa.
Precisamos todos de comer com regularidade. Os produtos alimentares que consumimos são produzidos, na quase totalidade, no mundo rural, pela agricultura e transformados pela agro-indústria de cá ou de outros países.
Só este “pequeno” facto deveria levar os nossos governantes a terem mais respeito pelo mundo rural e por todos os que nele vivem ou trabalham.
Mas o mundo rural é mais do isso. É também cultura, a mais genuína, a que melhor nos identifica como povo. É, principalmente, isto que deve ser respeitado e defendido.
Lido na Rádio Terra Mãe, em 25 de Junho de 2008.