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Alvitrando

Aqui se dão alvíssaras e trocam ideias sobre temas gerais, o Alentejo e o poder local, e vou dando notícias das minhas reflexões sobre temas da actualidade e de acontecimentos que achar que devem ser divulgados por esta via.

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Aqui se dão alvíssaras e trocam ideias sobre temas gerais, o Alentejo e o poder local, e vou dando notícias das minhas reflexões sobre temas da actualidade e de acontecimentos que achar que devem ser divulgados por esta via.

EM ALQUEVA, O ESTADO ACABOU POR SE REVELAR IGUAL A SI PRÓPRIO.

Zé LG, 19.02.18

 Foi diligente o suficiente para que a obra se concretizasse, mas foi negligente em demasia quando se tratou de lhe dar um fim.

Quem para o novo Frankenstein?

Após um investimento de mais de 2,5 mil milhões de euros, Alqueva, a par das suas vertentes ditas “menores”, como o turismo, o abastecimento público de água ou a produção energética, transformou-se no novo el dorado agrícola europeu. Há, até ver, 120 mil hectares de terrenos infraestruturados e prontos a produzir e as plantações instaladas geram já a fatia de leão das exportações agrícolas nacionais. Alqueva é um fator gerador de riqueza. E o Estado português, embora com um atraso de quatro décadas, fez a aposta correta ao definir no coração do Alentejo uma das suas maiores criações do pós-25 de Abril. O problema é que, também em Alqueva, o Estado acabou por se revelar igual a si próprio. Foi diligente o suficiente para que a obra se concretizasse, mas foi negligente em demasia quando se tratou de lhe dar um fim. Alqueva, no essencial, está concluído, mas não há um projeto para o uso harmonioso da terra, não há uma definição de política agrícola para o seu perímetro, não há normas, nem limites, nem convénios de boas práticas rurais. O Estado tratou de levantar betão, mas em nenhum momento se interessou pelo dia seguinte. E, nisto, a bela criação foi-se transformando num monstro. Ou, numa linguagem mais campesina, foi-se transformando num verdadeiro faroeste. Sabe-se hoje, pela voz de alguns dos maiores produtores de azeite da região, que para plantar um olival não são necessárias licenças, nem vistorias, nem passar cartão seja a quem for. A lei vigente é a do mercado, na sua mais elementar e cega acessão: a da oferta e da procura. Quem chega com dinheiro instala-se a seu bel-prazer, não passa cavaco a ninguém, usa a preços de saldo um bem finito e comum que é a água, e ataca a terra com ganância canina. Sem necessidade de licenciamento nem sujeição a fiscalização. E assim se percebe que as estações arqueológicas arrasadas que têm vindo ultimamente a público serão apenas uma infimidade neste recente mar de oliveiras. Estima-se que mais de 50 mil hectares estejam cobertos de olival, o que perfaz já mais de 55 por cento do território de Alqueva em produção. É de recear o pior. É de temer que esteja em curso o maior atentado patrimonial da história recente de Portugal. E é de desconfiar que a impunidade possa prevalecer neste País do vale tudo. Inclusivamente tirar olhos.

Editorial de PAULO BARRIGA, in Diário do Alentejo de 2 de Fevereiro de 2018.

 

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